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sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Chamarei de "morte qualquer".

[ DEIXE AQUI SEU TÍTULO]


Mas faça isso logo após ler, mentalmente, deixe sua imaginação te guiar nessa história. Guarde sua experiência para si.


Então....



Lá vai.





- Mortos não abrem a boca até alguém os chamarem para uma conversa, meu filho.
O pior de tudo é que o filho da mãe tinha razão.

Havia perigo eminente na rotatória do aeroporto, sirenes ressoavam no vazio da noite. Aquele som contínuo em parceria com aquelas luzes, somente iria crescendo, sucessivamente, o quanto eu ia me aproximando.
Como todos os demais carros, meu pé estava lentamente pisando o freio. O painel indicava 20km/h, pouco para se incomodar e muito para conseguir observar dezenas de cabeças ao redor de um corpo no chão. Eu ainda escutei parte do nome: "Denner", era o mesmo que o meu primeiro. Seu corpo estava debruçado de forma torta, inclinada, e seu rosto havia deformações e eu tenho absoluta certeza de que eram de herança do recém-acidente. Consegui ver suas pernas tortas, e seus joelhos arqueados para dentro, seus pés se tocavam. Seus braços sumiram, e longe dele um pouco sobre a calçada, havia uma moto(ou pelo menos o que restou dela) e no guidão, havia dois pedaços de carne mortas, como se... segurando até o último minuto.

Pessoas são curiosas e isso é verdade. Mas aquelas apenas iam e chegavam, ninguém aguentara ficar por ali (mas ainda sim uns iam e vinham, mesmo com alguns vomitando para o local dizer que não valeria a pena ver, mas pessoas são realmente curiosas e isso é de fato verdade), pois o cheiro estava forte e deplorável, em questões olfativas, o cadáver estava insuportável.

Alguns lobos que vinham da floresta ao lado da pista estavam à deriva, apenas observando, esperando, aguardando uma bobeira de alguém. Afinal carne ainda era carne, e melhor ainda quando ainda estava fresca.

Os mosquitos rodeavam. E eu acelerava, o trânsito estava ficando vago.
Pelo retrovisor eu vi um lobo esperto desviando, correndo, por entre as pessoas e roubando um dos braços e indo de volta ao renque, onde todo o bando o seguia e se perdia no meio do nevoeiro.
Eles uivavam.

De alguma forma.... Esta noite há uma família satisfeita. Seus estômagos não roncavam mais.

No outro dia eu sou "acordado", se bem que não dormir e fiquei pensando na cena, por um carteiro que montava uma bicicleta e arremessava jornais na vizinhança, ele acertou o vidro do meu quarto.

Se eu bem me lembro, eu era um cara importante para a rua, todos me cumprimentavam e sorriam para mim. Mas eu vesti shorts, e camisa e parti para uma boa caminhada para pôr a mente no eixo certo, todos pareciam zangados e nem me olhavam nos olhos, não falavam nada, apenas passavam como se eu não estivesse lá.

Eu não quis dar interesse nisso.
Então eu corri.
Cruzando a ponte Kneeling, logo depois do rio onde patinhos que navegavam com destreza junto a seus filhotes, também muito depois de um antigo Wall-mart que havia mudado de endereço não há muito tempo, chegando a um banco solitário foi onde me sentei para repôr as energias.
Coincidentemente, eu digo, quase que instintivamente, certeza - eu dou de cara com a igreja onde o cara que eu me mantive pensando durante todo o meu percurso, estava sendo velado. Eu não tinha o que fazer e parecia que minha estadia naquela cidade estava sendo totalmente ignorada e provavelmente um tanto quanto odiada, então eu entrei. Enquanto eu subia os degraus da igreja eu observei o sino tocando interruptamente por sete vezes, como de costume, e depois parar. Pensei em dizer que era amigo íntimo do morto, mas talvez isso não iria colar, havia familiares ali e eles reconheceriam quaisquer amigos da vítima. Então apenas iria dizer que conhecia, isso basta, de alguma forma isso seria suficiente. Eu espero.

Entro.

Como em qualquer velório eles todos estão chorando e os que não estão, permanecem emburrados ou meneando a cabeça em tom de negatividade. Não vi foto alguma de princípio. O padre dizia algumas palavra para aquele cara de mesmo nome que eu, como se ele estivesse mesmo ouvindo.


"- Irmãos, devo saturar aqui, que Denner era um cara da paz. Muito querido em nossa vizinhança..."

Eu parei de escutar nessa parte, alguém de mesmo nome e também querido na vizinhança. Que sentindo isso faria? Eu não o conheço, mas quem sabe ele não esteja se referindo á outra vizinhança, outro bairro, até cidade talvez. Se enterrar na cidade onde uma mãe idosa mora é uma coisa ideal a se fazer, ficaria perto demais para que ela possa visita-lo enquanto não toma o mesmo fim.

Foi aí que... ele disse. Ele abriu aquela boca imunda que há algumas noite pedira dinheiro dos fiéis e disse, disse com aquele gaguejar treinado para criar ênfase em suas frases, ganhar credibilidade. Ele disse.

" Denner Ayres, meu irmão e amigo, eu sei que está na paz de Deus, eu sinto você aqui, você está aqui?" (poderia não ser uma pergunta, mas sai como se fosse.)

O véu por cima da foto cai. Sou eu nela. Isso explica. Tudo.

O badalar de sino toca sete vezes mais e se silencia. Pássaros voam e eu consigo ouvir o bater de asas deles bem distante. Eu grito, um berro profundo e mortal, minhas últimas forças. Todos da igreja olham para onde eu estava sentado - dessa vez todos eles escutaram, e alguns fecharam os olhos que estavam em prantos. A igreja é silenciada um tanto quanto unanimante com o meu "sim".

Eu percebo que... estou preso a este mundo.

- Mortos não abrem a boca até alguém os chamarem para uma conversa, meu filho. - meu avô diz.

O pior de tudo é que o filho da mãe tinha razão.

Mas ele completou que:

- Meu filho, esta história não é para se contar para ninguém. Pois Denner Ayres vai buscar em seus sonhos, você. - Ele ri atonicamente. - Quem sabe ele já não está aqui?

Lógico que não acreditei.
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Mas pra falar a verdade, que som foi este que acabei de escutar?




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